Doraci já acordou pensativa como todos as manhãs de 24 de dezembro. Sete
filhos, três netas e uma bis a caminho.
Vestiu o uniforme, jogou água gelada no rosto, escovou os dentes, ferveu
seu corriqueiro chá de erva doce e bebeu bem doce. Saiu ainda meio sonolenta, era 4 da manhã, no
ponto de ônibus destelhado absorveu o sereno por mais de uma hora, até que o “Pedrão”
passou...
Adentrou o bus, saudou o motorista que ainda estava com remela, sorriu
para o cobrador e disse: não esqueça de mim em! Adormeceu por 40 minutos até
ser acordada com tapinhas no ombro.
O trabalho era duro, percorria 10 quilômetros varrendo o chão até a hora
do descanso da manhã... depois percorria o dobro até a hora do almoço. Nesse
dia Doraci estava pensativa, ela que acostumava a alegrar e motivar o time,
estava, como dizem “borocochó”.
- Todo fim de ano é assim! Disse uma amiga antiga à outra novata.
Hora de ir embora, bateu o cartão, pegou a caixa com panetone, cidra e
uva passa. O agrado que o patrão oferece pelo lucro acumulado o ano inteiro.
Doraci saiu correndo, passou na “feirinha”, comprou roupas, sandálias. No
busão não falou com ninguém, mas, aparentemente, ninguém queria conversar. O
mesmo motorista, o mesmo cobrador. A única palavra: - hoje já dirigi por 12
horas! “Quem tem ânimo pra resenha”. Pensou Dora, como era chamada pelas netas.
Saltou do ônibus igual canguru, ainda deu tempo de pegar o mercadinho com
as portas pela metade. Pediu dois quilos de salsicha, molho, macarrão, tubaína,
um monte de paçocas e balas de iogurtes.
Em casa encontrou as crianças jogadas no sofá, vendo TV. A chegada da
quase bisavó alegrou o ambiente, abraçou todo mundo com carinho, beijos e
afagos. Distribuiu roupas, sandálias e doces.
A filha mais velha preparou a ceia.
Antes da meia noite as crianças faziam a primeira refeição do dia.
A netinha levou ao quarto um prato com a massa, coberta de molho
vermelho. Encontrou sua avó roncando, vestida da mesma forma que saiu. Deu-lhe
um beijo na testa e disse: - Feliz Natal vovó...
Goesgoes